Guilherme José Purvin de Figueiredo
2013 foi, para o Direito Ambiental,
o ano dos debates em torno do princípio da vedação de retrocesso. Ao consagrado
congresso promovido em São Paulo pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde,
tivemos ainda o Congresso Brasileiro do Magistério Superior de Direito
Ambiental (Aprodab, Brasília), o encontro da Academia Latinoamericana de
Direito Ambiental (Ibap, Águas de Lindoia) e o Congresso Internacional de
Direito Ambiental (STJ, Brasília), todos centrados no debate e na divulgação das
mais importantes contribuições acadêmicas e jurisprudenciais voltadas à
identificação e implementação desse princípio.
Esse próprio debate merece uma
análise mais detida. Antes de mais nada, é preciso reconhecer que, além dos eventos
citados, por todo o país pipocaram encontros, congressos e simpósios, onde o
debate se travou, não no sentido da busca da efetividade desse princípio, mas de
sua negação. Numa síntese extrema, a tese seria de que esse princípio
simplesmente não existe, não tem sustentação no direito positivo e fere a
separação de poderes, na medida em que engessa a atividade legiferante.
Como
em qualquer debate científico, é importante ouvir os defensores da liberdade de
retrocesso legislativo. Os argumentos lançados em artigos publicados em sites
especializados, em encontros promovidos por entidades corporativas ou em salas
de aula precisam ser analisados e confrontados.
Já superamos,
porém, de há muito, os ingênuos limites da isenção. Aliás, foi graças aos acirrados
debates com cientistas contratados por grandes corporações em torno dos efeitos
da atividade antrópica no planeta (degradação da qualidade de vida, poluição planetária
das águas e do ar, redução dos espaços protegidos a simbólicas unidades de
conservação da natureza) que a teoria do aquecimento global evoluiu para a de
mudanças climáticas.
Todavia,
nos que concerne ao princípio da vedação de retrocesso, os limites de uma
discussão não são fatos científicos, mas cidadania: estamos falando sobre “o
futuro que queremos”. Por seu viés teleológico ou finalístico, a pergunta que
se faz é: “para que e para quem servem a Lei Complementar 140 ou o novo Código
Florestal?”
Não vivemos
num mundo maniqueísta em que a opinião pública se divida entre ambientalistas e
desenvolvimentistas. As mil palavras de ordem ouvidas nas “Jornadas de Maio” nos
mostraram um cenário vastíssimo, que não se circunscreve ao mundo jurídico. Recusar
o retrocesso ambiental implica também lutar pela transparência no setor público,
pelas liberdades e garantias individuais de orientação sexual, de igualdade de
gênero e raça, pelos direitos da pessoa com deficiência.
O
compartilhamento de dados nas redes sociais é um procedimento estratégico
valiosíssimo. Na era “Google”, lidamos com clusters de informações e
tendências políticas que vão muito além das redações de jornais e revistas
tradicionais ou de conferências intimistas ministradas em guetos corporativos e
em salas de aula. O isolamento do discurso para uma mesma plateia formada por pessoas
que comungam as mesma ideias quase sempre resultará em caricaturas de
radicalismo. E não é essa a fisionomia ideológica de quem defende o princípio
da vedação de retrocesso.
Recusar
o retrocesso ambiental é, necessariamente, recusar a ideologia totalitária de um
discurso que abre igualmente portas para o retrocesso de todas as conquistas
democráticas. Recusar o retrocesso é recusar a ditadura da ordem econômica em
nome da cidadania plena.