quinta-feira, 14 de março de 2013

“Direito e Política” debate a regularização de territórios quilombolas no RS


A Procuradoria-Geral do Estado e a Escola Superior de Advocacia Pública da Apergs (Esapergs) realizaram na terça-feira (12) a primeira edição de 2013 do Ciclo de Debates Direito e Política apresentando o painel Regularização de Territórios Quilombolas, com o Advogado da União e Coordenador-Geral Agrário junto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, Joaquim Modesto Pinto Júnior. Para o debate também o advogado e membro da Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas, Onir Araújo; e o Antropólogo e Professor da UFRGS José Otávio Catafesto de Souza.

Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), comunidades quilombolas são grupos étnicos, predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias.

O direito étnico-cultural é reconhecido constitucionalmente e, aos remanescentes dos quilombos que estejam ocupando terras, é dever do Estado emitir títulos com reconhecimento de propriedade. A afirmação é do Coordenador-Geral Agrário, Joaquim Modesto Pinto Júnior.

O Advogado da União fez referência aos marcos normativos infraconstitucionais do direito quilombola como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, adotada em Genebra em 1989, ratificada pelo Brasil em 2002 que, ao regular internamente o tratamento uniforme internacional sobre os Povos Indígenas e Tribais passou a ser invocado em benefício das comunidades quilombolas.

Dr. Joaquim Modesto citou, ainda, farta legislação a respeito do tema, com ênfase ao Decreto 4.887/2003, que instituiu o marco normativo federal vigente para identificação e delimitação desses territórios; o Parecer da AGU MC-1/2006, que firma interpretação jurídica acerca de aspectos do Decreto 4.887, vinculante para o corpo da Advocacia Pública Federal; e, por fim, a Instrução Normativa nº 57/2009 que adota os seguintes procedimentos: 1) autodefinição e certificação; 2) identificação e delimitação – editais e consultas; 3) contestações e julgamentos; 4) titulação e desapropriações.

Para as questões não regulamentadas existem soluções propostas pelo MDA, conforme observou o palestrante. “Quando se trata, por exemplo, de comunidades quilombolas com domínio privado individual desapropriam-se as terras tituladas e ocupadas individualmente, para posterior titulação à comunidade, que passará a se beneficiar em regime de ocupação e exploração coletiva”, explicou.

Os debatedores fizeram críticas contundentes aos Governos no que se refere a morosidade das titulações dos territórios quilombolas. “A gente vem operando o Direito na defesa dos territórios e percebemos uma série de contradições”, avaliou o Advogado Onir Araújo. Membro da Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas, o debatedor criticou, entre outras coisas, a cobrança milionária de IPTU no Quilombo da Família Silva em Porto Alegre. “Se os títulos são impenhoráveis, como Prefeitura vai executar?”, pergunta. Ele também questionou a forma como está sendo executado o plano de Notificação do Incra, em Morro Alto, onde apenas os quilombolas estão sendo notificados, sendo que o mesmo não ocorre com os grileiros dessas terras.

Para o Antropólogo José Otávio Catafesto de Souza, o diagnóstico que a antropologia pode fazer frente a estas questões são angustiantes. Segundo ele, apenas 5% dos territórios quilombolas foram regularizados num período de 25 anos. “Considerando este prazo, levaríamos alguns séculos para totalizar as regularizações”, estima. “Se na ditadura militar não havia espaço nem para conversar a respeito deste tema, hoje, em termos de rotinas, elas pouco se alteraram”, complementou. Catafesto defende que os governos criem uma agenda de atenção aos problemas das comunidades quilombolas. “Já que nós temos uma lei estadual aprovada pelo Parlamento, vamos conclamar para que o Estado do Rio Grande do Sul assuma lugar como protagonista nesta luta”, disse à plateia.

Durante as quatro horas de duração do debate, o público teve a oportunidade de manifestar-se questionando e cobrando dos integrantes da mesa maior efetividade no atendimento de políticas públicas para as comunidades quilombolas.

Palestrantes e público frisaram, em todas as intervenções, a importância da PGE-RS e da Espaergs estarem cada vez mais inseridas em questões de grande repercussão social, proporcionando a promoção de debates com especialistas, governos e sociedade.

A PGE-RS integra o Grupo de Trabalho (GT), instituído pelo Decreto nº 48.058/2012, que tem por objetivo a elaboração de propostas para implementação e o fortalecimento de políticas públicas destinadas ao povo quilombola. Segundo o Procurador-Geral do Estado, Dr. Carlos Henrique Kaipper, que coordenou os trabalhos juntamente com a Procuradora do Estado Dra. Fernanda Tonetto, Diretora da Esapergs, “o conhecimento acumulado e as propostas apresentadas no evento serão levadas como contribuições ao GT criado pelo Governador Tarso Genro.

Também compareceram no Ciclo de Debates o Coordenador da Comissão de Direitos Humanos da PGE-RS, Dr. Carlos César D’Elia, a Presidente em exercício da Apergs, Dra. Fabiana da Cunha Barth, o Diretor de Qualificação Técnica e Profissional do Sindicato dos Servidores da PGE, Daniel Franco Martins, o vereador Marcelo Sgarbossa, Procuradores do Estado, Servidores da PGE, Procuradores Federais e Servidores do Incra, representantes de comunidades quilombolas e de movimentos sociais.

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